quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Cospe pra cima que cai na testa

Ser mãe é se arrepender, eternamente, de coisas que falamos, juramos e criticamos na maternidade alheia e prometemos não fazer antes de sermos mães. Isso também pode/deve acontecer com os pais, mas tenho quase certeza absoluta que acontece mais com as mães, que idealizam a maternidade e romantizam a relação com os filhos.

Por algum tempo tenho convivido com um grande cuspe na minha testa: manter o casamento por causa dos filhos, no caso o filho. Sempre critiquei pais que mantiveram a relação/casamento, mesmo ruim, por causa dos filhos. Sempre achei um absurdo criar filhos em um ambiente instável "em nome da convivência com os filhos" ou qualquer coisa assim. No entanto, há muito tempo me vejo nesta situação. Levando adiante a relação péssima com o marido em nome da convivência da criança com o pai.

Por muitas vezes, e em muitas brigas, ele me disse que se tudo acabasse ele deixaria de conviver com o filho porque não suportaria conviver comigo sem estar comigo. Hoje, em outra realidade, entendo tudo como uma grande ameaça.

A verdade é que ele não era um pai presente e constante nem mesmo na mesma casa. Ele não é um pai presente e constante com o outro filho, mesmo nunca tendo tido uma relação estreita com a mãe da outra criança. Eu nunca achei que ele fosse ser diferente porque era meu filho. Eu nunca tive alguma ilusão de que ele seria um pai melhor porque era o nosso filho, mas mesmo assim eu quis ter um filho com ele. Mesmo assim eu posso dizer que paguei pra ver. Por muitos motivos e muitas vezes exigi dele e de sua obrigação paterna. Muitas vezes eu consegui mudar algumas coisas, em outras eu continuei falando (e fazendo e sofrendo) sozinha.

E, então, eu ficava lá convivendo com aquele cuspe em nome de sei lá o quê. Em nome de uma convivência dele com o pai, mas ao mesmo tempo submetendo ele a um clima péssimo, uma convivência ridícula, a situações ruins até que não deu mais. Vivenciei por algumas vezes o descaso que ele fazia do próprio filho caso a nossa relação não estivessem realmente bem. Afinal, se meu filho é meu tudo a melhor forma de me atingir seria através dele. E foi assim que ele deixou o menino na escola ou parou de ir buscá-lo - numa tentativa fracassada de me obrigar a chegar cedo em casa e me ter na rédea curta.

Já faz muito tempo que a relação não ia bem. Desgastada de tantos anos juntos (passado dos 10!). Já fazia muito tempo que as conversas resolviam cada vez menos. E os motivos precisavam ser cada vez menores para que houvesse um descontentamento muito grande. Fui deixando a situação se arrastar e meu filho presenciar discussões cada vez mais desnecessárias.

Até que chegou a um ponto que eu nunca imaginei chegar e, enfim, acabar. Acabou e eu, que pedi o ponto final da história, pude limpar o cuspe da minha testa e seguir. Seguir de uma forma não fácil, mas digna.

Eu e o Arthur ainda estamos nos ajeitando e tentando nos encaixar na nova realidade. Há 18 dias estamos nos acertando. Esta é a primeira semana que estamos de volta à nossa casa em uma relação exclusivamente nossa. Esta é a primeira semana em que o pai não foi vê-lo e a primeira em que ele pergunta diariamente pelo pai (afinal também é a nossa primeira semana em casa, então a ausência do pai evidenciou-se apenas agora). Esta também é a primeira vez que trato do assunto nas redes sociais, mas aos poucos vou me adaptando e abrindo o baú de tantas angústias e tristezas. Aos poucos, tudo volta ao normal e fica bem. Afinal, agora não preciso mais equilibrar o cuspe na testa.